“Vitória ou morte”: a crise no sistema democrático brasileiro
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No dia em que marca a suposta independência do Brasil, o Presidente articula com seus raivosos apoiadores uma manifestação de repúdio pelo Supremo Tribunal Federal e coloca em cheque a estrutura democrática do país.
De fato, Bolsonaro hoje não conta com um número substancial de apoiadores na população brasileira. Os números mostram que 58% da população inclusive apoia o impeachment. O que preocupa é o fanatismo dos seguidores que ainda lhe resta e que acreditam no seu discurso violento de que se articula hoje nas instituições públicas uma afronta à democracia e à liberdade religiosa, apoiando-se no próprio fanatismo religioso que o elegeu e na ganância de uma parcela do país que escuta suas falácias com louvor.
O discurso de Bolsonaro incita essa guerra entre os três poderes e visa a desestruturar o Estado Democrático de Direito, abrindo caminho para seu plano de ações destrutivas, com base em uma possível militarização do Estado e enfraquecimento das instituições públicas de caráter sócio-cultural, educacional e, principalmente, ambiental.
Estas políticas de desgoverno implicam em sérias consequências, chamando atenção de organizações internacionais de direitos humanos e ambientais que já movem ações exigindo esclarecimentos e até a criminalização dos atos do atual Presidente a nível mundial.
Temos conhecimento de que o atual governo dificultou o acesso ao tratamento de pacientes com Covid-19 nas proximidades de terras indígenas, o que bastaria para a caracterização de genocídio, mas além disso, o atendimento médico dos indígenas no sistema público de saúde se dá apenas em terras demarcadas, deixando os milhares de indígenas em contexto urbano e em terras não demarcadas sem assistência básica de saúde.
A construção desta política anti-indígena, que acontece desde o início do mandato do atual Presidente é fato inédito em território nacional, onde se desmantela toda a proteção das terras indígenas pelo incentivo da atuação ilegal dos garimpeiros e grileiros e ainda vem colocando em pauta projetos de lei que viabilizam tais práticas ilegais, desmantelando todo um sistema protetivo criado ao longo do anos nas casas legislativas do país.
O art. 6º do Estatuto de Roma, que trata de genocídio, prevê punição para “atos cometidos com a intenção de destruir, no todo ou em parte, um grupo nacional, étnico, seja por ofensas graves à integridade física ou mental dos membros do grupo; seja pela sujeição intencional do grupo a condições de vida com vista a provocar a sua destruição física, total ou parcial”.
Sendo assim, levando em conta sua atitude perante os Povos Originários e negros do país e recebida denúncia de diversas entidades brasileiras, o Comitê da ONU contra a Discriminação Racial emitiu um alerta de atrocidades para o Governo Brasileiro, com prazo de resposta até outubro de 2021 e caso a resposta não seja satisfatória, o caso avança no Comitê para instâncias superiores na ONU podendo ir ao Tribunal Penal Internacional de Haia, onde o Presidente já está respondendo pelo crime de genocídio e crime contra a humanidade por uma ação movida diretamente pelos povos nativos, através da Articulação dos Povos indígenas do Brasil (APIB).
Quanto ao caráter destrutivo ambiental de seus crimes, o Chefe do Estado brasileiro afrouxou medidas de proteção ambiental e colocou nos altos cargos de instituições que regulamentam a matéria seus favorecidos, grande parte (eu diria, todos eles) tendo seus nomes familiares ligados à invasão de terras indígenas ou agronegócio, o que inviabilizaria que trabalhassem à frente de órgãos de preservação do meio ambiente.
O que vemos hoje é histórico: um presidente que governa unicamente pelos interesses da classe favorecida deste país, em nome do agronegócio, madeireiras e mineradoras, envolvido em esquemas de corrupção e se colocando como inatingível e soberano.
Na última semana, suas falas traziam o 7 de setembro como o marco divisório na história do país:
“Nós não criticamos instituições ou poderes, somos pontuais. Não podemos admitir que 1 ou 2 pessoas usando da força do poder queiram dar outro rumo para o nosso país. Essas 1 ou 2 pessoas têm que entender o seu lugar”.
“O recado de vocês, povo brasileiro, nas ruas na próxima 3ª feira, dia 7, será o ultimato para essas duas pessoas. Curvem-se à Constituição, respeitem a nossa liberdade, entendam que vocês 2 estão no caminho errado, porque sempre dá tempo para se redimir.”
Ora, umas das bases do nosso Estado Democrático de pé é a divisão e interdependência entre os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário e o trabalho de cada um representando o POVO acima de tudo, dentro de suas competências.
Até diria que é ignorância do nosso representante maior do Poder Executivo, mas prefiro dizer que é incompetência e má fé, pois ele se auto afirma o maior representante do povo, se colocando acima do STF hierarquicamente e fala em não aceitar uma decisão da Suprema Corte judiciária do país como se estivesse acima dela.
Hoje, no 7 de setembro da dita independência, nos comprometemos com a verdade e a transparência e não podemos aceitar que um governante desequilibrado instaure o caos nas instituições que a muito custo estão protegidas pela constituição.
Pedimos respeito a Carta Magna e que se cumpra o poder soberano do povo: indígena, negro, LGBTQ+ e de toda a nação.
Golpitas não passarão.
Camila Saibro.